domingo, 21 de setembro de 2008

HILDACÍLA



Pobre velhinha!

Desde moça, dizia que se tivesse filhos, gostaria que estes fossem todos meninos, pois detestava “aquele jeito fresco e enjoado de menina”. Batata! Um ano depois do casamento nasceu o primeiro menino, João Vitor, e dois anos depois o segundo, José Henrique. Mas como era um tanto chata, ou como costumava dizer, “uma mulher exigente”, os filhos sempre foram mais apegados ao pai. E quando os filhos enfim chegaram naquela fase de namoro e por fim do casamento, afastaram-se ainda mais dela. Afinal, era muito difícil para as noras conviver com a sogra que geralmente se referia a elas como “sirigaitas”, “aproveitadoras” e muitos outros adjetivos depreciativos. Depois que seu velho bateu as botas então, as coisas ficaram piores ainda! Os filhos apareciam uma vez por mês e olhe lá. Nem mesmo os netos (todos os três, meninos) lhe davam muita atenção preferindo a companhia de suas avós maternas.

Não tinha jeito. Por mais gosto que tinha pela companhia masculina, sempre perdia o páreo para outras mulheres: as noras, a outras avós de seus netos; até seu marido quando vivo preferia estar com as “sem-vergonhas com quem pulava a cerca” do que com ela. O único macho que considerava lhe ser fiel, era o Boris. Um Siamês que já por três anos amenizava os pesares de sua viuvez.

Não gostava de futebol, assistia à novela a seu lado todo dia e toda vez que sentia fome, ao invés de perguntar se a janta estava pronta, vinha se esfregar em suas pernas enquanto ronronava pedindo atenção. Quanto a outras mulheres, não chegava nem perto, principalmente de suas noras (para sua satisfação). E se alguma se aproximava, ficava todo arisco, mostrando logo as garras e presas. Em resumo: tudo aquilo que ela esperou que os homens de sua vida lhe dessem, Boris dava de sobra.

Mas a alegria durou pouco. Num domingo nublado, pôde ver pela fresta da cortina a chegada um caminhão de mudança. Torceu o nariz ao ver sua nova vizinha administrando o descarregar de seus móveis. Por volta das seis da tarde, quando preparava o apetitoso jantar de Boris – whiscas sache - ouviu o tin-dom da campainha. Era ela, a nova vizinha. Uma loira (tingida) de cabelos encaracolados (pixaim) e olhos azuis (lentes de contato), vestindo uma calça leg (de perua) e uma blusinha (com um decote enorme!) e segurando seu animal de estimação (pulguento) no colo. Uma gata angorá de pelo acinzentado (cor de burro quando foge).
- Boa tarde. Sou sua nova vizi...
-Não estou interessada!
-Não senhora, eu não estou vendendo nad...
Bateu a porta atrás de si e pode escutar a moça dizendo:
- Nossa, que grossa!
Deu um sorrisinho de canto de boca, e resmungou entre os dentes: - Rapariga! - e começou: - psiu – psiu-psiu Boris meu nenê, vem com a mamãe, vem. Boris, Boris cadê você? - olhou ao redor, e não achou o bichano, abaixou-se com muito esforço, mas não o viu debaixo da pia. – Boris, Boris, seu levado! Não se esconde da mamãe senão você não ganha papa! – apurou a audição, que era muito boa para sua idade, e escutou:
- Olha Tifani, que gracinha! Parece que você arranjou um namorado.
A velha endoidou! – Namorado? Namorado? – repetia. Virou numa velocidade e como se fosse o Jack Chan, pulou os degraus da escadinha que saia de sua porta e correu na direção da mulher enquanto gritava:
- larga ele sua desfrutada! Larga meu nenê!
A mulher tomou um susto, e quando menos esperava já tinha a idosa a estrangular-lhe o pescoço através das barras do portão.
– Sai de perto dele, vocês já levaram meus homens embora, mas o Boris ninguém tira de mim.
- Socorro, socorro – urrava a mulher num grito sufocado pelas mãos enrugadas da anciã. Foi um barraco só! A vizinhança inteira apareceu na janela. A senhorinha, após cansar de estrangular a loira, agarrou o felino pelo rabo, e o arrastou para dentro enquanto a rua toda a vaiava.

A velhusca passou um tempão sem dar as caras. E quando apareceu não era mais acompanhada por Boris que, conforme contam, podia ser visto muitas vezes trancafiado em casa a olhar pela janela em busca de Tifani sua amada – é, foi paixão a primeira vista. A vizinha bonitona, ficou tão envergonhada com o caso, que preferiu pagar aluguel em outra vizinhança. Mas por descuido de sua dona rabugenta que esqueceu a janela aberta, Boris desapareceu sem deixar pistas.

A velhota virou só tristeza. Não comia, não dormia e muito menos tomava banho (podem imaginar a catinga?) No entanto um belo dia, acordou com uma disposição que não mostrava a anos, se é que já havia demonstrado. Tomou café, banhou-se (enfim!), e foi até o pet shop. - Bom dia! Vim compra um animal de estimação. Pode ser qualquer tipo, desde que seja fêmea. - Desculpe senhora, mas não temos todos os bichinhos que temos a venda no momento, são machos. A não ser aquele hamister .
- Vou levar. Cansei de machos em minha vida! Se tivesse tido uma filha talvez não fosse tão sozinha agora.
Comprou ração, uma gaiolinha e saiu a cantarolar e a conversar com o roedor, ou melhor, roedora a qual deu o nome de Guilhermina. Tornou-se outra. Agora cumprimentava as vizinhas, e até sorria!

Mas, talvez por alguma decepção amorosa, Boris resolveu voltar. Nesse dia a velhota, que aguardava a visita dos filhos e até das noras (pasmem!) com ansiedade, deixara Guilhermina livre a passear pelo assoalho. – Guilhermina, onde você foi parar menina? Joãozinho e Zézinho estão chegando com as crianças. Você não quer ser pisoteada não, né?
Entrou na cozinha e engasgou ao ver: Boris como quem acabará de dar o bote, estava com um bigode estranho no focinho. Um bigode marrom, mexendo pra lá e pra cá. - Nãaaaaaaão!!!
Os filhos que já estavam no portão, correram para acudir a mãe. A coroa estava estatelada no chão, tremendo, com o indicador apontando para o gato
. - Gui- Gui- Gui...
Todos olharam para o siamês. Esse, como que com medo de lhe tirarem a refeição, chupou o que restava da Hamister (seu rabo) para dentro da boca, como quem chupa macarrão.
Ao ver a cena, a velha desengasgou: Gui - Guilhermina!! Deu um ultimo suspiro e virou o rosto para lado, já dura e fria.

Na lápide foi escrito o seguinte epitáfio:
- Aqui jaz Hildacília. Viveu todos os anos em função dos homens de sua vida – seu marido, filhos e netos.
Morreu devido à única “menina” que já amou.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

terça-feira, 2 de setembro de 2008

UM FATO MARCANTE NO VELÓRIO DO PAI DE PROMONTÓRIO CAPELINO DE SOUZA

Aquele dia não fora como os demais em minha vida.
Ele estava fadado a marcar definitivamente todo meu passado e futuro.
Eu, Promontório Capelino de Souza, tenho comigo que este é um dos dias que nunca vou me esquecer, é o dia em ele morreu.
Não que tenha sido um bom pai, muito pelo contrário, foi uma péssima pessoa. O tipo de homem que batia na mulher, e nem ligava pros filhos. Por isso, eu nem gostava dele. Mas nunca vou me esquecer do dia em que ele morreu.
Estava quente naquele dia, o tipo de calor que só quem nasceu no nordeste consegue suportar. Apesar de eu não ter sentido pena pelo falecimento de meu pai, tive que comparecer ao velório, claro, como manda a boa educação e respeito. Então, lá estava eu, andando de um lado pro outro, observando os parentes e amigos, que vinham me cumprimentar, e dar os pêsames. Eu fingia que estava sentindo pesar, pra não ser mal-educado.
Vários parentes que nunca vinham nos visitar estavam lá. Talvez pra se certificarem de que ele estava mesmo morto, não sei. Também tinha muitos amigos dele. Eu só ouvia comentários do tipo "Ele era uma ótima pessoa", "Ele vai fazer falta", "Um homem bom como ele não se encontra todo dia", Nem parecia que estavam falando do mesmo homem que eu conheci, que só falava comigo quando era pra exigir alguma coisa, e ai de mim se eu não obedecesse!
Num cantinho, uma tia chorava como uma bezerra desmamada, sempre com algum outro parente a lhe oferecer um braço como consolo, e um lenço limpo pra ela enxugar as lágrimas.



Como meu pai morreu,é mais um exemplo de como sua vida era devotada às besteiras inúteis.Ele morreu lutando por nosso jornalista Aristarco Vieira de Melo,o dono do jornal "Os Sertões",o qual meu pai,um leitor assíduo,comprava todos os sábados.E,assim como os fiéis da igreja Jesus Virá,Aleluia!...,meu pai acatava todas as opiniões contidas no jornal com se fossem leis absolutas.
E,por isso,quando Aristarco começou uma série de provocações contra o músico Talinho Malino de Menezes,meu pai,como um fiél seguidor do jornalista,falava mal do músico,mesmo que nunca tenha ouvido uma música sequer dele.
Aristarco,como a mairoria dos honens que conseguem grandes cargos na sociedade,usava e abusava de sua condição.Como dono do jornal,se fazia o responsável por tudo o que aconecia na cidade.Como se o fato de noticiá-las o tornasse o dono dos ocorridos.Quando um determinado evento ocorria na cidade,o sucesso,segundo ele, era consequência de seu empenho em exibir Curiapeba em seu jornal."Uma cidade só cresce quando sua história é registrada e noticiada!",ele costumava dizer.E,se alguém discordasse de qualquer coisa publicada,ou por qualquer outro motivo,se tornasse um desafeto do dono do jornal,ele publicava uma nota mencionando como a pessoa agia com má fé contra os modos da cidade.
E, como tambem acontece com homens de grande posição,ele arregimenta uma legião de cegos seguidores.Como meu pai.
Só de ler que Talinho estava misturando a música caribenha com a música brasilçeira,meu pai já esbravejava que isso era cuspir na cultura nacional,um desrespeito aos nosso verdadeiros costumes,e outras sentenças,repetidas quase exatamente como eram redigidas no jornal.
Foi isso que o fez ser morto,naquela tarde de sábado,na praça das boiadas,em meio àquela algazarra toda que se instalou no centro de Curiapeba.Foram socos pra um lado,pontapés pra outro,gente correndo e se escondendo.E duas mortes,entre as quais,meu pai.
Aristarco Vieria de Melo,o herói que meu pai defendia,após levar os primeiros sopapos dos defensores de Talinho,fugiu,e se escondeu nos fundos do bar do João Emílio Krauser,ele nem deve ter visto o que aconteceu, enquanto a população de Curiapeba demolia o centro da cidade,cada grupo defendendo um dos lados da bruiga.
Meu pai devia estar no bar do João Emílio,bebendo catilóia.Provavelmente,ele deve ter ficado enjuriado ao ver seu ídolo todo esfolado,e entrou na briga,que só acabou quando os tiros para o alto do coronel Benvindo dos Santos Arruda Real se fizeram ouvir.
Quando a poeira assentou,e os dois corpos foram levados para suas respectivas casas(coincidentemente,um dos mortos defendia Talinho,o outro,o meu pai,defendia Aristarco),as pessoas se fizeram sentir pelo jumento esfaqueado,mas os mortos,só as famílias sentiram,os outros,nem devem se lembrar que duas pessoas morreram ali.
O jornal Os Sertões,que meu pai tanto adorava,noticiou o fato,mencionou a morte do jumento,mas não mencionou nomes dos homens mortos.É isso que meu pai ganhou por ter entrado na briga de quem nem sequer o conhecia.Mas duvido que Aristarco iria ao velório de meu pai,mesmo que o conhecesse.
Mas ,vamos voltar ao que eu realmente quero contar sobre o velório de mau pai:


Eu estava cansado, e com calor. Não queria estar ali. Mas tinha que estar.
De repente, entra no recinto uma senhora, que eu não conhecia, acompanhada de uma moça lindíssima. Morena, com cabelos volumosos, lábios carnudos, que mais pareciam uma flor, olhos grandes, e um corpo cheio de curvas, do tipo que deixa qualquer mancebo de cabeça virada. Todos os homens que ali estavam olharam pra moça, apesar de ter que manter o respeito pelo finado.
A senhora entrou, aproximou-se para ver o corpo, e cumprimentou alguns dos presentes. E eu fiquei curioso em saber de quem se tratava.
Eu cheguei a minha mãe, mas, pra não dar na vista, usei de um pequeno subterfúgio:
- Mâinha, quem é aquela senhora que acabou de entrar?
- Num sei, não, meu filho. Dispois eu pergunto.
Enquanto isso, eu continuava curioso em saber quem era aquela moça tão bela.
Eu andava de um lado pra outro, sempre "esbarrando" em algum amigo do meu pai, ou algum parente, que me abraçava, ou apertava minha mão, se demorando por algum tempo, pra me contar alguma história vivida com meu pai, como se eu estivesse interessado. E, pra não ser mal-educado, eu fingia interesse. Mas eu nem sequer ouvia, meu olhar estava na moça. Eu dava uma espiada rápida, disfarçadamente, pra onde ela estava. Eu não queria perdê-la de vista. Queria aproximar-me dela, e perguntar quem ela era, como alguns dos homens já estavam fazendo. Mas eu tinha que dar atenção pra todos os parentes, tinha que fingir que estava sentindo a morte de meu pai, não podia me aproximar da moça sem dar na vista das pessoas.
Quando finalmente, me livrei do amigo de meu pai, e sua história fascinante de alguma aventura qualquer de adolescente com meu pai, meu olhar procurou a moça. Mas não a achei.
Droga! Eu a tinha perdido.
Mas ouvi a voz atrás de mim:
- Olá!
Virei-me, e lá estava ela, que me estendeu a mão.
- Meus pêsames pela morte de seu pai.
- Obrigado.
Retribui o aperto de mão. E não resisti em perguntar:
- Você conhecia meu pai?
- Não, eu não. Eu só estou aqui pra acompanhar minha tia. Ela conheceu o seu pai, quando ele era moço.
Ao dizer isso, ela deu um breve sorriso. Um lindo sorriso. Eu, então, aproveitei.
- Meu nome é Promontório Capelino de Souza. - eu disse, estendendo novamente minha mão.
- E o meu é Imbromélia Cromilda Adelaide. Muito prazer!
Depois disso, passamos o velório todo conversando, e nos conhecerndo melhor. Depois do funeral, combinamos de sair. Ficamos noivos em pouco tempo, e hoje, somos casados, e temos três filhos.
Por isso, sempre que chega o aniversário da morte de meu pai, eu agradeço. Ele pode ter sido um péssimo pai, mas pelo menos, sua morte foi um dia especial pra mim, pois foi onde eu conheci Imbromélia, a mulher da minha vida.

terça-feira, 17 de junho de 2008

Susy e Malô numa receita de amor eterno...




Vocês não acreditam em amor eterno? Então vocês precisam ler minha novela Susy e Malô numa receita de amor eterno. Acompanhe a partir deste primeiro capítulo CLIQUE AQUI e leia o primeiro capítulo...




Aristides Theodoro



sexta-feira, 16 de maio de 2008

DOIS VELÓRIOS PARA UM SÓ DEFUNTO

*extraído do periódico “Os Sertões” do dia 04 de janeiro.

Alguns na cidade já devem me conhecer. Sou Mario Robério Moreno, do estado de São Paulo. Lá, publico o famigerado periódico “A Voz do Mal que Há”, que tem como objetivo, elucidar a luz da ciência, casos tidos como “sobrenaturais” ou “inexplicáveis”. Como digo naquela publicação, o verdadeiro “mal que há” por trás de tudo que existe de estranho, é justamente a ignorância e a superstição no coração dos homens que os leva a classificar o que não entendem, como manifestações sobrenaturais.
Um caso desse gênero ocorreu há alguns meses aqui mesmo, com um conterrâneo meu chamado Lucio Marcio Krauser, primo do ilustre morador da cidade, João Krauser, que veio a Curipeba com o objetivo de investir seu capital na região.O certo é que, no feriado de 15 do mês de novembro do ano passado, sua esposa, a senhora Maria Antonieta Krauser, o encontrou morto pela manhã. Por não ter muitos parentes ainda em São Paulo, e devido ao transtorno com a locomoção do corpo, a viúva preferiu enterrá-lo aqui mesmo na cidade.O corpo foi velado na propriedade que o casal havia adquirido, próximo ao centro da cidade.
Compareceram ao enterro, vários cidadãos célebres como João Krauser primo do falecido, Maninha de Matos, o prefeito Polissílabo Saraiva, nosso querido editor Aristarco Vieira e seu companheiro Ozanâ Torquato Velho além dos irmãos Justino e Esmeraldino Troncoso, dentre muitos outros coronéis. Segundo testemunhas, a viúva, que vestiu o falecido com seu melhor terno, mostravam-se inconsolável, debruçando-se sobre o caixão enquanto dizia coisas como “me leve junto com você”, por que Deus te tirou de mim?”e “volte, volte, na me deixe sozinha”.
Num dado momento do funeral, quando a viúva encontrava-se de costas para o caixão a receber os pêsames de alguém, o defunto simplesmente descruzou os dedos de cima do peito, e estendeu a mão para o lado, alcançando o dorso da viúva. Passou a apalpá-la enquanto dizia:
- Amor, onde estão meus óculos?
Acontece que ele era extremamente míope, e por não enxergar praticamente nada sem os óculos, não percebeu que estava em um caixão sendo velado. E imaginando-se em sua cama, ficou a tatear em busca de seus “olhos artificiais”. A viúva olhou por sobre os ombros, e ao ver o finado marido levantando-se, soltou um berro de horror e medo.
As pessoas no recinto tiveram reações diversas: uns desmaiaram, outros se colocaram a gritar em coro com a viuvinha, alguns até mesmo se atreveram a jogar-se pela janela do sobrado sofrendo contusões sérias. No entanto, um coronel chamado Justino Troncoso, que era justamente quem dava os pêsames a viúva neste momento, permaneceu inerte como uma estátua paralisado de medo.
Neste momento, o próprio morto-vivo assustou-se com a gritaria e tombou com o caixão no chão. Recobrou-se do tombo, levantou com as mãos estendidas feito um zumbi de folhetins de terror ou uma múmia saída do sarcófago e saiu a tatear o ar em busca de apoio. Então, provavelmente reconhecendo a viúva pela bela silueta – que eu particularmente tive a oportunidade de conferir – o pseudo defunto partiu rumo a ela dizendo:
- O que ouve querida? Viu alguma assombração?A viúva pendurou-se no pescoço do coronel Justino, que até este momento permanecia paralisado de medo, e clamou por socorro. O coronel acordou de seu transe, acredito que incentivado pelo agarrão da linda viúva, sacou a pistola da cintura e descarregou o pente inteiro no pobre coitado, furando todo seu lindo terninho
engomado.
O segundo velório fez-se bem mais tranqüilo, de acordo com as poucas pessoas que tiveram a coragem de comparecer. João Krauser, o primo, que não se conformava com o ocorrido nem deu as caras. A viúva não fez nenhum escândalo, permanecendo o tempo todo longe do caixão. Ao lado dela, o coronel Troncoso, que desde o acontecido não desgrudou da viúva a consolar-lhe.
Muitos da cidade consideraram o caso como sendo uma aparição sobrenatural. Eu, porém, classifiquei-o como um raro caso de catalepsia: um problema físico que leva a pessoa a um estado semelhante a morte; a vitima acorda depois de um tempo, como quem desperta de um sono. No entanto, como o caso é inédito nos anais de Curiapeba, o coronel Justino Troncoso foi isento de qualquer responsabilidade pela morte de Lucio Krauser, já que este já havia sido considerado morto.
Quanto à viúva, a senhora Maria Antonieta, pareceu muito grata ao coronel Justino Troncoso, já que ao vigésimo quinto dia do mês de fevereiro, pretende contrariar matrimonio com o mesmo.

- Por Mario Robério Moreno – sempre em busca da verdade.

***ESTE CONTO É BASEADO NA OBRA DE ARISTIDES THEODORO SOBRE A FICTÍCIA CIDADE DE CURIAPEBA E FAZ PARTE DO PROJETO DO LIVRO "HISTÓRIA DA S ESTÓRIAS DE CURIPEBA" QUE TEM COMO OBJETIVO FAZER UMA HOMENAGEM AO ESCRITOR E SUA OBRA.

- ESCRITO POR MARCOS ROBERTO MOREIRA (QUALQUER SEMELHANÇA COM O NOME DO "ESCRITOR DO ARTIGO DO JORNAL" DO CONTO, NÃO É MERA COINCIDÊNCIA)

NICTOFOBIA

NOTA: Este foi o primeiro conto que escrevi,por isso que está uma merda!


Terror.Essa palavra ecoa em sua mente,enquanto ela caminha pelas ruas e avenidas da cidade.Ela amaldiçoa seu chefe por pedir que ela fique até mais tarde;amaldiçoa a esposa do chefe por escolher dar a luz justo no horário normal de sua saída;e amaldiçoa o prefeito por não criar uma linha de ônibus que pare em frente à sua casa.
Não que isso seja totalmente confiável.Afinal,quantos ônibus não são invadidos todas as noites>E a cada dois ônibus assaltados,em um morre o motorista,no outro morre o cobrador.Por isso mesmo,o ônibus não aliviaria seu medo,seu terror.
Mas ela pega um ônibus mesmo assim.Ela não poderia atravessar toda a cidade a pé.
Ao descer do ônibus,a cerca da uma quadra para a rua onde mora,tentando não ser notada até o caminho de casa.
Não era uma rua deserta.Muito pelo contrário,havia pessoas,embora já passasse da meia noite.Também não era mal iluminada.Todos os postes tinham lâmpadas novas,que iluminavam muito bem.
Talvez esses sejam os causadores do terror.Afinal,cada luz sobre ela era como se disesse "Venham todos os predadores noturnos!Ela está soziinha e amedronatada!Uma presa fácil!"
O fato de haver pessoas na rua também não ajudava.Ao contrário do que se pensa,um lugar movimentado não significa segurança.Quando não há ninguém na rua,é fácil parar para ouvir se não há alguém te seguindo,ou mesmo escolher o lado da rua pelo qual andar.Mas essa rua,cheia de pessoas...
Um grupo de jovens pode tanto significar amigos namorando,quanto viciados usando drogas juntos.Ela poderia olhar para confirmar,mas se algum deles interpretar mal esse ato,ela se tornmaria uma vítima deles.
Ela não olha.
Ela desvia o olhar e continua caminhando.
Novamente,ela profere uma maldição.Desta vez ,aos seus sapatos.Cada "Clap" de seus saltos no asfalto são como sinos anunciando sua passagem.Novamente,ela se sente vulnerável. Principalemte ao ouvir passos atrás de si.São passos de tênis,abafados,como que tentando não se fazer ouvir.
Cautelosamente,ela apressa seus passos.Chegando em casa,ela estará segura.Mas os passos continuam atrás dela.
Em uma bar próximo,um carro de polícia estacionado.Por um momento,ela se sente a salvo.Como se as palavras "proteger e servir" a reanimasse.Por um momento.Apenas por um momento.
Ao se aproximar,ela vê os dois policiais.Ela ouve um deles comentar o formato esguio de suas pernas,realçadas pela meia calça preta,que,à luz dos postes,brilham com luxúria.Ela desvia e segue o seu caminho.
Por um instante,ela havia esquecido seu perseguidor.Ela se vira pra trás,e não o vê.Porém,ela ouvve o chiar de um portão enferrujado,o barulho de chaves,seguida da frase:
-Cheguei,mãe!-que dizia o "perseguidor".
Se não estivesse tão cansada,ela sorriria.
Por sorte,agora,ela estava segura.Agora,bastava chegar em casa.Estava próxima.Era apenas virar uma esquina e atravessar a rua.De onde estava,naquele momento,já dava pra ver o seu lar.
Ela então relaxa,e pensa no gato siamês que deve estar com fome.E,relaxada,ela não ouve o homem a esperando atrás de um poste,de tocaia.Ela aprenas sente a mão suada em sua boca,o corpo forte atrás de si,a ponta da faca em suas costas,e um hálito alcoolizado que sussurra:
-Quietinha,senão te furo!
Neste momento,o tempo parece parar,e uma palavra ecoa em sua mente:terror.

(outono/2000)

ATRÁS DA ESTANTE

Leitor hipócrita!Sente prazer em tirar entretenimento do sofrimento de seus semelhantes!Dedica-se à leitura de contos de terror apenas para encontrar a ruína de pobres almas atormentadas por horrores terríveis.
Não venha negar esta verdade!Você não se importa com a vida dos personagens.Sente-se satisfeito apenas com a danação deles.
Olhe para seu íntimo e pergunte-se se não é verdade.Se não o fosse,o leitor daria alguma importância à breve existência de Sandro Silva?Não,nunca.Mesmo agora,sabendo de sua existência,pouco lhe importa quem ou o que ele foi.
Pobre publicitário curioso;Dedicado à sua profissão,passava horas noite afora,trabalhando em sua casa,desenhando storyboards pra comerciais de tv.Horas essas cuja solidão de solteiro só era aplacada pela presença de Elvis,seu gato de estimação.
Elvis era um gato alegre,brincalhão,e curioso.Qualidade esta que chega a ser irônica,revendo o que acontecxeu posteriormente.Sandro possuia o gato à poico mais de um aano,metade do tempo em que morava em sua casa própria,depois de alguns anos dividindo um apartamento alugado com um colega de faculdade.Ele se considerava um homem abençoado por ter conseguido um emprego numa agência publicitária tão logo terminou a faculdade.
Sandro não imaginava o que o futuro lhe reservava.
Apesar de ainda não ter encontrado o amor de sua vida,Sandro sempre dedicava alguns minutos de seu tempo na agência para conversar com uma secretária que lá trabalhava.Loira,cabelos curtos,seios que saltavam aos olhos quando ela ia ao trabalho com blusas decotadas.Sandro pensava em convidá-la pra siar,"tomar alguns drinques,dançar,ir ao cinema,essas coisas",enquanto desenhava.Ele estava fazendo o storyboard de uma propaganda de cerveja.Pessoas bebiam numa praia.Ele pensou em desenhar a bela secretária.Colocar o rosto dela em uma das mulheres que bebiam cerveja na praia.depois,mostraria pra ela,que se sentiria lisonjeada,o que facilitaria pra ele conquistá-la.Ele até imaginava a cena:
-Veja só o que fiz ontem.
-O que é?Outro storyboard?-Diria ela.
-Sim,dê uma olhada!
-Bonito!-Diria ela,enquanto admirava os desenhos.Você é um excelente desenhista!
-Veja o rosto desta moça!
Ele apontaria para a loira de cabelos curtos usando biquini,e com uma lata de cerveja na mão.Ela ficaria espantada por um segundo,depois sorriria admirada.
-Sou eu?
-Sim,é você.Gostou?
-Claro.
Então,ele diria o quanto a acha atraente,e o porquê de tê-la desenhado.Ela se encantaria,e ele a convidaria pra sair.
Mas,e se ela se sentisse constrangida por ter sido retratada de biquini?E se seus seios estiverem desenhados maiores do que são realmente?Como reagiria?
Ao pensar nisso,decidiu desenhar todas as mulheres do storyboard com cabelos compridos,a maioria com cabelos pretos.
Terminados os desenhos,Sandro pousa o lápis na prancheta e olha as horas.1 hora da manhã."Até que acabei cedo,hoje".Ele baixa o olhar para Elvis,que estava ao lado da estante da sala,olhando pela fresta entre a estante e a parede.Sandro chamou o gato pelo nome,que,ao ouvir,desviou-se do que fitava e foi até seu dono,esfregou-se em suas pernas,e começou a ronronar.
-Um lanchinho antesde dormir?Que tal?
O gato então miou,como se houvesse compreendido o que o dono sugeria e lhe estivesse respondendo afirmativamente.Então,os dois se dirigem até a cozinha,o gato mais apressadamente,quase derrubando o dono,fazendo-o tropeçar em seu corpo.Sandro então coloca um pouco de ração no prato de Elvis,e em seguida serve-se de um copo de leite e duas fatias de um bolo que sua mãe lhe trouxera no último domingo.E foi dormir.

***
Na noite seguinte,Sandro trouxe mais trabalho pra casa.Ao abrir a porta e entrar na sala,seu olhar caiu diretamente em Elvis,que novamente estava ao lado da estante,olhando pela fresta entre ela e a parede.Ao ver o dono,Elvis abandonou o que fazia e correu para suas pernas,esfregando-se.
Sandro deixou suas coisas numa escrivaninha,e foi até a cozinha,dar comida para o gato.em seguida,foi tomar banho.Isso era apenas uma parte do seu ritual quando chega em casa.Depois do banho,um lanche.Um pouco de tevê("não perco Jornada na sestrelas por nada",ele diria),o jantar,e só então,ao trabalho.Mais um storyboard,mas pra outro comercial.
Enquanto desenhava,Sandro pensava na secretária;Cada dia ela parecia mais encantada ao conversar com ele.Por isso,ele não dava atenção ao gato,cuja cauda balançava de um lado para o outro,demonstrando uma certa impaciência por parte do gato,que observava algo atrás da estante.
A certa altura,Sandro se levantou para ir ao banheiro.Quando faz isso,Elvis costuma se levamntar e correr na mesma direção,se precipitando na frente do dono,e indo até a cozinha,imaginando talvez que receberia mais um pouco de comida.Desta vez,ele não fez isso,tão entretido que estava com o que quer que houvesse atrás da estante.
Sandro sequer percebeu desta vez;Apenas quando saiu do banheiro,e não viu o gato no corredor,voltou para a sala e viu o gato,concentrado no que fazia.
-Elvis...
Mas o gato não desviou seu olhar ,apenas mexeu as orelhas na direção do dono,que sem dar maior atenção ao gato,voltou para sua prancheta,para terminar seus desenhos."Provavelmente,deve ter uma lagartixa,ou barata,encurralada lá atrás",pensou,"Os gatos às vezes parecem ter um poder de hipnose em suas presas."Quando morava com seus pais,sandro teve um gato que hipnotizava baratas,deixando-as por horas imóveis num canto da casa,como se estivessem mortas.Elas só voltavam a se mover quando alguem mexia nelas.
Naquela noite,Sandro terminou seu trabalho à 1:27 da madrugada,se levantou e foi pra cozinha tomar uma copo d'água antes de ir dormir.Elvis não o seguiu.Ficou a fitar o vão entre a estante e a parede.
***
Sexta-feira,último dia útil da semana.O dia favorito de todo trabalhador.E,naquela sexta-feirta,as coisas foram ainda melhores para Sandro.Ele ouviu a linda-loira-gostosa secretária dizer "claro,eu aodraria!"para ele.
-Ótimo.Então,nos encontramos às 7:00 hs da noite lá.
-Vou adorar!
Depis disso,Sandro voltou pra casa,contente.pois ele tinha um encontro,com uma garota linda,e sentia que agora iria ter um compromisso sério.Chega de só "ficar".Isso é coisa pra adolescentes.
Para ter o fim de semana todo dedicado à garota,Sandro decidiu terminar seu trabalho naquela mesma noite.Desenhou até pouco mais de 2:00 da madrugada.Haviua pouco trabalho naquela noite,mas durante todo o tempo,Elvis o incomodava.
A princípio,o gato apenas olhava para o espaço atrás da estante.Mas depois começou a mexer a cauda impacientemente.Mas a atenção de Sandro só foi despertada quando o gato começou a colocar sua pata no vão,como se tentasse pegar algo.
Sandro começaou a desviar sua atenção dos storyuboards para o gato.Se não fosse por isso,teria terminado mais cedo.Quando então o gato começou a miar,Sandro não conseguiu mais se concentrar nos desenhos.
Felizmente,um storyboard não precisa ser uma obra de arte.Mas mesmo assim,ao terminar de fazê-lo,deu uma olhada,e concluiu que,no dia seguinte,precisaria fazer uns retoques em várias pranchas.E o gato ainda miava.

***
Ao se levantar no dia seguinte,Sandro planejava começar o ritual do fim de semana,que consistia em arrumar a casa e lavar roupa,a começar logo após o café da manhã.
Elvis estava na sala,ainda a fitar atrás da estante.Da cozinha,Sandro podia vê-lo,enquanto passava margarina na torrada.A cauda se mexando convulsivamente.Sandro mordia a torrada.O gato olhava fixamente poara o vão.Sandro o observava.O gato começou a miar.Sandro ficou curioso.O gato miava.
Ao terminar de tomar cafá,Sandro decidiu ver o que havia atrás da estante que deixava Elvis perturbado.Ele iria arrastar o maldirto móvel,e ver o que tinha atrás.Só esperava que não uma barata.Seria uma merda perder tempo por causa de uma barata.
Primeiro,Sandro desplugou da tomada a tevê e o dvd.Tirou os aparelhos e os colocou no sofá.Em seguida,os livros,depois os poucos enfeites e retratos.Retirou tudo o que havia na estante,com Elvis a miar no seu ouvido.Depois,arrastou a estante,afastando um dos lados da parede o máximo que pôde.Havia um buraco na parede,próximo ao chão.Um enorme buraco.
Elvis,num impulso,pulou para atrás da estante,entrando pelo buraco.Devia ser um buraco fundo,pois o gato sumiu por ele.Sandro tentou impedi-lo,chamando seu nome,mas não conseguiu.
Sandro pegou uma lanterna,se colocou de quatro atrás da estante,engatinhando até o buraco.Ele olhava pra dentro do buraco,grande o suficiente pra caber uma pessoa,chamando por Elvis.Como o gato não respondia a seu chamado,Sandro entrou pelo buraco,atrás dele.

***

Naquela noite,às 19:50,uma linda secretária,loira e furiosa,deixou o restaurante onde estava,decidida a dar uma bronca no homem que a deixou esperar quase uma hora à um encontro,que seria o primeiro entre eles.Mas ela não teve oportunidade,pois nunca mais o viu.Na verdade,ninguem nunca mais viu ou soube que fim levou Sandro Silva,ou Elvis.
A polícia,chamada semanas depois pela mãe de Sandro,encontrou o buraco na parede,escavou o chão da casa,o quintal próxima à parede,e não encontrou nenhum vestígio deles.
Pra onde eles foram?Algum dia voltaremos a ter notícias deles?Quem se importa?Você,com certeza não.Você,como leitor.está apenas satisfeito por ter acompanhado mais uma tragédia.Imaginando qual será a próxima história de terror que vai ler.Provavelmente esperando que haja muito mais horror,violência e danação do que nesta.
Já foi dito que lê-se histórias de terror fictício pra fugir do terror real.
Mas acho que alguns leitores são apenas sádicos.

sábado, 3 de maio de 2008

CONTINUAÇÃO DA HISTÓRIA DE PORTOVALDO JUSTOMAR - CAPITULO QUARTO E CAPITULO FINAL

  ***ESTES SÃO OS DOIS ÚLTIMOS CÁPITULOS DO CONTO 
SOBRE PORTOVALDO JUSTOMAR.
ANTES DE LÊ-LOS, QUEIRA LER OS 3 PRIMEIROS CÁPITULOS
POSTADOS ABAIXO
( COMECE NO FINAL DA PÁGINA ONDE
ESTÁ O PRIMEIRO CÁPITULO E VÁ SUBINDO LENDO OS OUTROS
DOIS ATÉ CHEGAR NESTES 2 ÚLTIMOS, QUE ESTÃO POSTADOS JUNTOS)
 

 ***APÓS A LEITURA, CONTO COM O SEU COMENTÁRIO.
(É SÓ CLICAR 
EM "COMENTÁRIOS " E DIZER OQUE ACHOU)

SUA CRITICA ENRIQUECE NÃO SÓ O BLOG, COMO A MIM COMO ESCRITOR.
OBRIGADO, E ATÉ A PRÓXIMA     



**ESTE CONTO É BASEADO NA OBRA DE ARISTIDES THEODORO SOBRE A FICTÍCIA CIDADE DE CURIAPEBA.








CAPITULO QUARTO: O NASCIMENTO DE VITELINHO NO CASARÃO DA FAZENDA BARAUNA



            Os nove meses de gestação transcorreram tranqüilamente, a não ser pelos últimos dois. Não que Rosalinda estivesse correndo algum risco na gravidez. Não, não se tratava disso. O problema era seu nervosismo extremo a medida que chegava o dia do parto. Um nervosismo como o de quem estava prestes a chegar em vias de fato, embora não se soubesse qual seria o fato propriamente dito. O certo é que achou-se por bem Rosalinda passar os últimos dias de gravidez no casarão ao lado de sua mãe Dona Bobolonha, parteira renomada entre a criadagem de seu Coronel Vitelo.
           No dia do parto foi aquele alvoroço. Todos na casa correndo para lá e para cá, os gritos da gestante, as falas estranhas de Bolonha e por fim o choro do mancebo, que chegava ao mundo por volta das 2:00 da tarde.
           Portovaldo veio do serviço ver a mulher e estranhou saber que a o filho havia nascido horas antes, sem que ele fosse avisado.
           Adentrou no casarão como sempre, pedindo licença a todos e teve a impressão que as pessoas estavam cochichando e o olhando de forma estranha. Chegou enfim no quarto em que a esposa estava com o recém-nascido. Rosalinda segurava a mão de sua mãe enquanto contemplava o berço ao seu lado com um olhar triste, resignado. Ao ver o marido na porta, só faltou pular da cama.
           - Você...? sussurrou.
           - É claro – retrucou Portovaldo – vim conhecê meu fio.
           Ao olhar o menino deitado, foi ele quem tomou um susto. O menino era alvo e tinha cabelos castanhos-claro.
           - Parecer com o mãe – disse bolonha quebrando o silêncio crepitante.
           “É”-pensava Portovaldo “com o pai é que não parece”. “Pelo menos não comigo”.
           Examinou o menino: A cor da pele, o cabelo abundante, as mãos, o furinho no queixo... A quem lhe lembrava aquele furo no queixo? Foi então que chegou coronel Vitelo, como sempre acompanhado de Muriçoca. Mais gordo doque nunca, com seu bigodão já grisalho, os olhos fechados como sempre e perdido em meio ao sua papa de sapão, o queixo furado. O queixo furado... “Num podi sê. Aquele furo no queixo. Aquele maldito furo. Igual ao do nenê. Igual ao do... ao do filho do coroné”.
           Depois daquela conclusão ele não pode ver nem ouvir mais nada. Nem o coronel lhe dando os parabéns de forma sem graça, nem as pessoas perguntando como o pequeno se chamaria, nem mesmo Rosalinda dizendo que ele se chamaria Vitelo, em homenagem ao coronel que ela considerava com a um pai.
           De repente, as pessoas perceberam que Portovaldo havia sumido. E conforme os dias iam passando, pouco se ouvia falar dele. As vezes era encontrado no meio da roça, caído ao lado de uma garrafa vazia. Outras vezes, achava-se trancado no casebre em meio ao odor de urina e cachaça. Mas ninguém ousava perturbar o pobre coitado, que de matador, passou a ter fama de corno inconformado, causando pena até mesmo em Muriçoca, seu desafeto de longa data.
Já Rosalinda, nunca mais voltou ao casebre, preferindo ficar ao lado da mãe na casa grande. Mas também nunca mais foi a mesma. Sempre voada, com cara de quem esperava, segundo diziam, a chegada do coronelzinho.
           Quanto ao coronel Vitelo, não admitia publicamente que o molecote fosse seu neto. No entanto, ao sentar em sua velha cadeira de balanço na varanda, contemplando o menino já crescido correndo atrás das galinhas, foi pego algumas vezes dizendo:
           - Pelo menos aquele peste me deu alguma coisa de bom.

CAPITULO ÚLTIMO:
O AJUSTE DE CONTAS ENTRE PORTOVALDO JUSTOMAR E CEVILHO SARAIVA DE ARROBA VASTOS



           O menino já estava com três anos, quando Cevilho apareceu novamente. Mas, para a infelicidade de Rosalinda, ele veio acompanhando por uma mulher que conhecera em São Paulo chamada Filomena de Arruda Prado, ou Filozinha para os íntimos. Era uma moça de uns 25 anos, cabelos loiros encaracolados, olhos azuis e e finos modos. Vivia sempre de vestido rodado, um chapeuzinho de fresca e com um leque sempre a se abanar.
           Cevilho declarou ao pai ter-se casado com ela. Resolveu passar um dias com a recém-esposa na fazenda, para lhe mostrar “as maravilhas da chapada diamantina”. O pai fazia-se surdo sabendo que o filho só havia voltado porque tinha gastado todo o dinheiro, e que bastava dar-lhe alguns tostões para que “o peste” sumisse de novo.
           No dia que Cevilho e sua esposa chegaram, Rosalinda desapareceu. No entanto, a única a perceber sua ausência foi sua mãe, Dona Bolonha. O coronel, que nessa época já apresentava uma saúde debilitada, estava muito ocupado em dar atenção ao menino Vitelinho.
           No dia seguinte, coronel como de costume acordou e foi ver o mancebo. Deu um urro ao perceber que o pequeno havia sumido, sem deixar nem sequer um par de meias como vestígio de sua existência. Rosalinda havia voltado a noite sem que ninguém percebesse, e levado o filho embora. Bolonha, que foi acordada pelo grito do coronel, correu para a porta do quarto. Encontrou o coronel caido no chão com a boca espumando. E antes mesmo que um médico pudesse ser trazido do centro para acudi-lo, ele já estava morto.
           Embora tivesse modos rudes de sertanejo, o coronel era muito bem quisto na cidade. Por isso compareceram ao seu funeral diversos cidadãos celebres em Curiapeba tais como Maninha de Matos e seus amigos Porto riquenhos, João krauser, Polissílabo Saraiva que era tio de sua finada esposa,e até mesmo o padre Giracino Bembém de Arruda Real e o pastor Genocídio Geronso Gerrafino, além de muitos outros coronéis e pessoas comuns da região.
           Num dado momento do velório, Muriçoca viu o vulto de um homem pela janela. Era Portovaldo Justomar. Sem ser notado, Muriçoca saiu do recinto e foi ter com o homem do lado de fora. Chegando ao lado dele disse:
           - Eu tava me perguntando quando vosmecê ia aparecer.
           Portovaldo permaneceu mudo fitando o corpo através do janela.
           - Sabe, no começo eu num gostava de vosmecê. Mas dispois do que se assucedeu, tive pena de tu. Eu só nun intendí por que vosmecê num feiz nada com a praga do coronelzinho. Nem o pai dele ia sentí farta.
           - Eu jurei que ia serví a ele. - falou Portovaldo acenando com a cabeça para o corpo.- E o peste é filho dele..
           - Ele num ti contô, num é? - questionou Muriçoca.
           - Contou o que? - perguntou de volta Portovaldo, franzindo a testa.
           - Ele num ti deu guarida porque gostô docê. Ele te devia.
           - Devia oque? - perguntou Portovaldo cada vez mais irritado.
           - O homem que vosmecê despachou, o tal Portovaldo seu pai (ao falar isso, Muriçoca pode sentir os olhos de Portovaldo faiscando), ele era amigo do coroné.            - O coroné se apaixonou por sinhá Seventina Saraiva, sobrinha do doutô Polissílabo. Ele gostava da danada. Gostava di verdade, sabe? Mas ele conseguia ter mais trato com os bichos da fazenda do que com mulé. Já Portovaldo...paricia que tinha mel. O disgramento seduziu a pobre, e dispoís largô a contada prenha. O coroné Vitelo gostava tanto dela, que aresolveu casá cum ela e assumí o fio dela. Mas ela perdeu o muleque, e acababou engravidando di novo, só que agora, o fio era do coroné. Mas como ela num se cuidava direito, num guentô o parto. O coroné nunca se esqueceu do ocorrido e tratou de despachar o muleque pra Salvador logo cedo e dispois pra Sum Paulo pra modí estudar, por que num guentava olhá pra cara dele. Mas oque mais machucava o coroné, não era ter perdido ela na morte. Nem era por ele ter sido traída pelo seu melhô amigo. O que deixava ele mais cabreiro, era sabê que ela morreu amano Portovaldo. Foi por isso que ele num deixou eu te matá. Por isso ele deixou vosmecê morar aqui e se casar com a menina Rosalinda. Porque foi vosmecê que despachô o desinfeliz.
           Ao ouvir a história, Portovaldo ficou boquiaberto a fitar o nada, como quem desvenda um segredo milenar. Começou a andar feito zumbi, entrou na casa, chegou ao lado do caixão e disse na frente de todos:
           - Minha dívida tá paga.
           Cevilho, que estava ao lado da esposa, sentiu os joelhos bater e o sangue gelar. Portovaldo que fitava o caixão, desviou o olhar para ele, que só faltou desmaiar. Já sua esposa Filozinha, ficou tão acesa ao ver Portovaldo, que disparou a se abanar feito louca. Portovaldo retribuiu o olhar insinuante da moça, e saiu em silêncio na direção do casebre. Cevilho tentou recompor-se enquanto disfarçava o nervosismo com um sorriso amarelo dizendo:
           - Rê, rê, ele era muito apegado a meu pai.
           Quando olhou para o lado, percebeu que a esposa não estava mais ali. Esta só foi aparecer bem mais tarde e disse ter se trancado no quarto todo esse tempo devido uma indisposição, e só não contou a ele, porque não queria perturbar o “maridinho com aquela bobagem”. O marido estranhou, já que havia entrado no quarto horas antes e não encotrou a esposa.
           - Seu tolinho – respondeu ela – foi no quarto de cima, perto do sótão.
           Apesar de não engulir, essa Cevilho tinha coisas mais importantes em que se preocupar (a herança)
           Duas semanas depois do enterro, num sábado, Cevilho foi ao centro da cidade acompanhado de Muriçoca. Foi levar mantimentos para serem vendidos na feira, e aproveitou para dar um pulo no bar João Krauser, tentando enturmar-se com os intelectuais da cidade, com seu papo massante e seu jeito cretino.
Foi quando ouviu um grito de fora do bar:
           - Cevilho. Cevilho. Venha cá disgramento!
           Cevilho veio até a porta do bar e pôde ver. Era Portovaldo Justomar Postado na praça das Boiadas vestido apenas com uma calça branca. Ao vê-lo, Cevilho sentiu um frio subir-lhe a espinha.
           - Venha – gritou novamente o negro.
           Em um instante, a praça das Boiadas já estava lotadas. Pessoas vindas, da feira, da rua, dos comércios ao redor - de todos os lados. Alguns haviam estado no enterro de Coronel Vitelo, e conheciam a história por trás do confronto. Cevilho, afim de disfarçar o medo, estendeu as mãos, colocou aquele seu sorrisinho estupido na boca, e disse em voz alta tentando convencer a si mesmo:
           - O que foi vingador, veio me pedir alguma coisa. Meu painho deixou de te pagar?
           - A divida que eu tinha com vosso pai, tá paga. - respondeu – é com vosmecê que tenho que me acertar agora.
           - Direitos trabalhistas, hein? Você pensa que está aonde, na Europa? – Falou Cevilho, tentando arrancar risos da platéia, que se conseguiu entender a piada, preferiu não se manisfestar. Cevilho dirigiu o olhar para Muriçoca fazendo-lhe um sinal para que ele o socorresse, mas Muriçoca fez-se de desentendido.
           Voltou o olhar para Portovaldo. Este estava balbuciando como quem marca um ritmo, um compasso, através do som. Começou então a gingar capoeira, jogando para trás um pé depois o outro, num ritmo cada vez mais veloz. Cevilho sorriu, arregaçou as mangas de sua camisa engomadinha, posicionou-se de forma patética e disse:
           - Então quer brigar? Vou te mostrar o que aprendi em São Paulo com um amigo Japonês: - Karatê!
           A maioria ali nunca tinha visto um Japonês, e muito menos sabiam o que era esse tal Karatê. Cevilho soltou um grito afeminado: - Kiaaa! - e avançou para cima de seu oponente.
           Portovaldo, sem tocar as mão no chão, saltou no ar, e numa pirueta, atingiu a nuca do idiota. Este, avançou para frente “catando cavacos” até cair enfim de cara no chão levantando poeira. A multidão foi ao delírio, vendo o paquiderme estirado ao chão. Este levantou com a mão no queixo aparando o sangue que caia em bicas e disse:
           - Beu dariz vozê guebrou beu dariz!
           A euforia era geral. Cevilho levou a mão a cintura em busca da pistola. Não encontrou nada! Olhou para o lado e viu que Muriçoca estava com revolver dele na mão. Muriçoca havia apanhado a arma de seu coldre sem que ele percebesse!
           Agora estava claro! Tudo aquilo tinha sido planejado entre os dois, talvez desde o enterro de seu pai. Então, todo seu medo e a sua dor, foram substituídos por uma fúria descomunal. Lembrou-se da faca que guardava por dentro da bota. Apanhou-a e partiu para cima de Portovaldo, como um touro contra o toureiro.
           Portovaldo lançou-se ao ar como se a gravidade não o dominasse mais, e atingiu Cevilho novamente. Lançou-se de novo, e de novo atingindo-o golpe após golpe, rodopiando, dançando em pleno ar, como um príncipe africano, com seu corpo negro reluzindo a luz do sol. Um verdadeiro guerreiro, uma força da natureza.
           Já Cevilho, recebia tantas pesadas na cara, que não tinha nem a chance de cair. Ficava a bailar sob os golpes do negro, como um fantoche nas mãos de um ventríloquo. E ao cair finalmente no chão - mais exausto de apanhar do que o outro de bater – rastejou tentando alcançar a faca caída a sua frente. Quando enfim alcançou-a, sentiu o pé descalço de Portovaldo esmagar-lhe a mão.            Portovaldo agachou-se, colocou a faca atrás, na cintura, virou o corpo de cevilho para cima e debruçou-se sobre ele. Portovaldo fixou seu olhar sobre o oponente que mesmo com olho inchado pôde enxergar o olhar fuzilante dele.            Depois de uns segundos fitando-o – segundos que pareceram uma eternidade, tão grande era o silencio na praça – Portovaldo passou a esmurar-lhe a carona contra o solo e a dizer:
           - Queixo furado!! Maldito queixo furado!
           Cevilho estava preste a desfalecer, quando Portovaldo abaixou-se ao pé de seu ouvido e disse sussurrando:
           - Eu tive di guentá treis anos de disaforo, sendo tratado como chifrudo porque me sentia em divida com vosso pai. Agora que paguei minha divida cum ele, vosmecê é que me deve. Me deve sua vida miserável que eu polpei hoje. Por isso, vosmecê vai cuidar do menino como se fosse seu.
           - Mas o menino foi embo...
           - Cala boca!! - gritou Portovaldo interrompendo o traste. Baixou a voz novamente e continuou a dizer:
           - Se eu souber que vosmecê maltratou o muleque – e eu vou saber – vosmecê é um homi morto.
           - Muleque? Que muleque? Questionou Cevilho ainda lembrando do menino que Rosalinda levou embora.
           Portovaldo respondeu: - Vosmecê vai saber. Pegou então a faca presa em suas costas e cravou-a na coxa direita de Portovaldo com tamanha força que quase varou no chão.
           O homem soltou um grito horrendo de dor como ninguém jamais havia escutado. Um grito tão horripilante, que todos os cães começaram a ladrar e os pássaros espantados partiram em revoada.
           Portovaldo levantou-se e saiu andando traquilamente. A multidão abriu caminho para a sua passagem e ele seguiu estrada a fora até sumir na linha do horizonte.
Depois desse dia, nunca mais foi visto por aquelas bandas. Alguns se perguntam se ele assumiu o nome de Cervilho após vigar-se dele, assim como havia feito com o ultimo homem que se vingou.
Quanto a Cevilho, nunca mais apareceu no centro da cidade. Uns acreditam que seja por causa da perna ferida que o condenou a mancar pelo resto da vida. Já outros, culpam a humilhação que sofreu as mãos de Portovaldo em plena praça das Boiadas, na frente de todos.
Dizem que ele fica sentado na varanda, na velha cadeira de balanço de seu pai, contemplando o filho que sua esposa ganhou uns nove meses após a morte do Coronel Vitelo, correr atrás das galinhas no terreiro.
           O menino é saudável, embora não se pareça muito com Cevilho. Ele não possui sua pele clara, seu cabelo liso e muito menos o tal do furo no queixo. Na verdade, o menino tem o cabelo um tanto crespo e é meio escurinho.

 
FIM





terça-feira, 29 de abril de 2008

***OBS.:ANTES DE LER ESTE CONTO, QUEIRA LER OS DOIS PRIMEIROS CAPITULOS POSTADOS MAIS EMBAIXO (COMECE PELO FINAL DESTA PAGINA E DEPOIS VENHA SUBINDO PARA PODER LER ESTE CAPITULO)

CAPITULO TERCEIRO:A VOLTA DE CEVILHO SARAIVA DE ARROBA VASTOS APÓS OITO ANOS EM SÃO PAULO.


Os dias deram lugar aos meses, e os meses aos anos. Rosalinda Raskovich, que ao casar tinha o aspecto de ninfetinha, havia aumentado as ancas o volume do seios, e embora conservasse o olhar obliquo, tornou-se mais maliciosa e madura. O marido, é claro, aprovava as mudanças da mulher. A única pertubação que tinha quanto a ela, era o fato de não ter engravidado, mesmo após quasto anos de casamento. As más línguas diziam que a esterilidade ruiva dava-se graças aos chás fornecidos pela mãe que “não queria ter um neto pretinho”.
Um dia, por volta das 2:00 horas da matina, uma barulheira na arinha que ficava na parte da frente do casarão, fez com que todos acordassem. Coronel Vitelo e Muriçoca, surgiram pela porta da frente vestidos apenas em roupas de baixo e com armas em punho. O coronel, que não se surpreendia a anos, chegou a arrepiar o bigode e a derrubar a arma tão grande foi o susto. Olhou para baixo e exclamou com a maior surpresa do mundo: - Cevilho?
A isso, a figura bêbada e sujismunda caida aos pés da escada respondeu:
- Painho, não vai abraçar seu filho?
Rosalinda, depois do marido sair para o trabalhar na roça, ia para o casarão, onde auxiliava sua mãe e as outras que alí trabalhavam, nos afazeres da casa. Porém naquele dia, ao chegar no casarão por volta das 5:00 horas da manhã, se espantou com o movimento no local – um movimento que não era comum nesse horário. Ao encontrar a mãe em meio a criadagem toda alvoroçada, perguntou: - Mãe, o que esta acontecendo?
- O menina Cevilho, chegar ontem.
Ao ouvir isso, Rosalinda perdeu totalmente a compostura. Suas bochechas coravam enquanto sentia aquele friozinha na barriga. Daí, ficou um tempo parada tentando digerir a informação. Faziam 8 anos que ela não o via. Deixou então a mente vaguear, lembrando das beijocas e brincadeiras de ambos na árvore detrás do galinheiro. Da ultima vez que se viram, ela tinha 12 anos e ele 16. O que ele acharia dela agora? “Será que tô disarrumada, engordei muito, ele vai me achar bonita, e quando ele souber que eu... quando ele souber do meu marido?” - eram tantas questões em uma única fração de segundo, que chegavam a lhe dar náuseas.
Ela criou coragem, tomou fôlego, e seguiu em frente, atravessando o trânsito de pessoas - as criadas feito loucas em preparar as boas vindas – indo direto ao quarto dele. Ele estava deitado de barriga para cima, com as mãos cobrindo seus olhos dos primeiros raios de sol, como quem passa pela pior ressaca do mundo.
Ela adentrou no quarto, aproximou-se da cama, e com as costas da mão, acaricio-lhe o rosto. Mas ele permaneceu quieto, inerte, como se não tivesse notado sua presença. Então, uma voz vinda do corredor atrás de si dizendo “Rosalinda”, a fez despertar de seu estado de transe. Ela irrompeu de repente em corrida na direção da cozinha.
Ao meio-dia, com o sol a pique, tanto os agregados do casarão quanto os rurais, que haviam sido convidados ao banquete, postavam-se a mesa, colocada fora da casa em frente a entrada. O homenageado, com as mãos segurando a cabeça, como que tentando segurar o peso da ressaca, surgiu pela porta e contemplou à mesa todo tipo de comida: desde cereais, aipim e saladas à porco recheado e suculentas fatias de carne de carneiro. Sentou-se ao lado do pai, mas só pareceu acordar realmente ao ouvi-lo dizer:
- Apesar de não ser esperado, meu filho veio passar uns dias conosco. Só espero que não gaste tanto dinheiro aqui quanto gasta estudando no Sul.
Todos riram. Cevilho, que foi o único a não ver graça na piada do pai, olhou repentinamente para o lado, e pôde ver uma mulher ruiva de vestido florido servindo à mesa. Ela, que fingia não perceber estar sendo olhada, debruçou sobre a mesa afim de colocar as louças e talheres, e deu-lhe uma olhadela de canto de olho. Portovaldo, que encontrava-se no outro extremo da mesa, pela primeira vez cismou-se da esposa ao ver a troca de olhares.
Três dias depois, Portovaldo que não vinha muito ao casarão, teve de levar um recado do coronel a sua sogra. Chegou a porta, chamou mas não foi atendido. Adentrou então à casa rumo a cozinha. Foi quando escutou um zum-zum-zum vindo da dispensa. Reconheceu a voz da esposa e de alguém, um homem. E ao se aproximar mais, começou a distinguir também a voz do homem: era de Cevilho – o filho do coronel.
Pé após pé, foi chegando cada vez mais perto, sem ser notado, até poder discernir parte da conversa:
- ... que você ficaria tão linda.
- 'Gradecida Vilinho, quer dizer nhô Cervilho.
- Sem cerimônia. Você pode me chamar do que quiser.
Portovaldo chegou no canto da parede e pode espiar oque estava acontecendo. Sua esposa Rosalinda estava encostada na parede com as mãos para trás, e a cabeça abaixada dando-lhe um aspecto de timidez, enquanto o fulano, ficava a prensa-la na parede prestes a...a...
- Rosalinda – exclamou Portovaldo com sua voz áspera, interrompendo a regalia.
- Portovaldo? - respondeu Rosalinda, e de corada como estava, devido as cantadas do abusado, passou a empalidecer ao ver o esposo.
- Sua mãe. - limitou-se a dizer enquanto lançava-lhe um olhar que valia por 10 mil palavras. Em seguida lançou o mesmo olhar mortífero ao “coronelzinho”.
- Ah, então você é o famoso Portovaldo Justomar, o vingador dos sertões. Sabe, eu e sua esposa fomos criados juntos. Somos como irmãos – falou e soltou um sorrisinho de debilóide fingindo-se tranqüilo, mas no fundo, cagando-se de medo.
- Assim espero...finalizou Portovaldo e após outra olhada fulminante, saiu sem dizer mais nenhuma palavra.
Nas duas semanas seguintes, Rosalinda não deu mais as caras no casarão, alegando ter pego uma “gripe daquelas”. Um dia depois da volta do sinhozinho a São Paulo, Rosalinda voltou as atividades na casa grande ao lado da mãe, já curada da “repentina gripe”.
Tudo pareceu voltar ao normal, a não ser por uma única coisa: O relacionamento de Rosalinda Rascovioch com Portovaldo Justomar, seu marido. Depois de ter visto novamente o filho do coronel, mostrou-se ansiosa, distraída, e quando este voltou para o Sul, ela tornou-se cabisbaixa, triste e de quando em quando, era pega chorando escondidinha em algum canto. Passou a evitar o marido sempre que possível, hora por dor de cabeça, hora por indisposição, e era comum estar “naqueles dias” mais de duas vezes por mês. Foi quando que, ao final de dois meses, veio a confirmação do que ela alegou ser o motivo de seu estranho comportamento: Havia finalmente engravidado!

CONTINUA...

***CONTINUE A ACOMPANHAR A SAGA DE PORTOVALDO, E POSTE AQUI SEU COMENTARIOS.

E ATÉ A PRÓXIMA...

quinta-feira, 24 de abril de 2008

A HISTÓRIA DE PORTAVALDO JUSTOMAR E DO FILHO QUE ERA MAIS NÃO É E DO QUE NÃO ERA MAIS É.:

***OBS.:ANTES DE LER ESTE CONTO, QUEIRA LER O PRIMEIRO CAPITULO POSTADO LOGO ABAIXO

CAPITULO SEGUNDO:
O CASAMENTO DE PORTOVALDO JUSTOMAR COM ROSALINDA RASKOWICH


Passaram-se três dias e três noites em meio a febre delírios do homem. Neste período, ele ficou sob os cuidados de Bolonheska Raskovich, uma Polaca gorducha conhecida por todos pela alcunha de "Dona Bolonha".
Ela havia chegado ao Brasil junto com o ex-patrão 18 anos antes. Acabou sendo abandonada em Curiapeba, grávida de 5 meses e sem falar uma única palavra em português. Coronel Vitelo, ao ver a dita cuja - na época um verdadeiro filézinho – sentada na Praça das Boiadas, de bucho cheio e cheia de bagagens, resolveu acolhe-la em sua fazenda. Já faziam 3 anos que sua esposa morrerá no parto deixando-lhe um filho pequeno, e aquela polaca poderia muito bem fazer as vezes de mãe do rapazote. Desde então ela vivia na casa grande junto com sua filha, a graciosa Rosalinda Rascovich, uma rapariga magrinha mas de corpo bem torneado com seios pequenos mas altivos. Tinha uma pele alva com pouco de sarda no colo e ao redor do nariz arrebitado. Seus cabelos eram ruivos, e seus grandes olhos, eram de um verde-água reluzente; resumindo - um a verdadeiro pitélzinho.
Rosalinda ajudava sua mãe nos afazeres da casa, com seu jeito tímido, sempre correndo da vista dos outros, olhando a tudo e todos de soslaio. Até a chegada do negro. Ao ver aquele homem seminu deitado na cama, ela ficou hipnotizada! Seu corpo negro brilhando de suor e seus lábios grossos balbuciando coisas sem sentido, lhe faziam sentir uma quentura que nunca havia sentido antes.
E ela não perdia tempo: vivia a passar pano úmido pelo corpo dele com a desculpa de aliviar-lhe a febre, aproveitando para passear com os pequenos dedos por seus músculos. E toda vez que se achava sozinha com o enfermo, depois de examinar cuidadosamente ao redor para não ser pega, beijava-lhe os beiços molhados.
Em um desses beijos, que lhe acendiam como brasa em fogueira de festa junina, o cabra acordou de seus delírios. Vendo-a com os lábios encostados aos seus, agarrou a meninota na altura dos ombros e com um gesto rápido jogou-a sobre seu corpo. Essa arregalou de susto os olhos esmeraldas, e murmurou um "não" abafado pelos lábios dele, mas em uma fração de segundos, fechou nos olhinhos e se entregou as sua carícias.
De repente, os dois ouvem um grito acompanhado de palavras sem sentido ditas em uma ligua estrangeira mas que claramente distinguiam-se como xingos e maldições. Ele olhou para o lado, e pôde ver a mocinha pular de cima dele e passar velozmente pela porta como um cabritinha fugindo do carcará. Prostrada à porta, encontrava-se a figura volumosa de "Dona Bolonha" com as mãos no rosto e esbravejando com ele. E ele, ainda meio tonto pela febre ou pelos beijos da ruivinha, viu chegando a porta um mundaréu de rostos e vozes estranhas perguntando mil coisas ao mesmo tempo. Então uma voz sobressaindo-se a toda aquela babel disse:
- O que se assucede aqui.
Todos inclusive a Polaca calaram-se, e deram passagem ao Coronel. Logo atrás dele chegou o Capataz Muriçoca já de espingarda em punho. O coronel fez-lhe uma careta, mas ele não entendeu a recado, pois estava distraído em mirar para o homem que o havia humilhado noites atrás. Vendo que Muriçoca estava doido para puxar o gatilho, Coronel lhe deu um safanão e disse:
- Baixe a pistola seu besta, antes que ele tire ela de você de novo - Fale Bolonha, que diacho tá acontecendo aqui. Mas fale de um jeito que eu entenda.
- Ela... – disse Bolonha em meio a lágrimas e apontando o dedo para o negro – ela agarrar meu menina Rosalinda. Todos – e eram muitos - em uníssono disseram: - ooooh!!!
Ouve um instante de silencio, e logo a babel inicio-se novamente.
As mulheres benziam-se protestando contra a pouca-vergonha ocorrida no recinto, enquanto os homens entreolhavam-se com um sorriso no canto dos lábios, imaginando se teriam um dia a mesma sorte do forasteiro. O coronel fingia-se sério, mas o bigode arqueado para cima formando uma meia-lua, denunciava-lhe um sorriso sarcástico. Foi então que, ao ver as lágrimas escorrendo pela face de Bolonha, recobrou a seriedade. Sacou o revolver da cintura e disparou para o alto gritando:
- Vamô cambada, eu não pago ninguém pra ficar de conversê não!
Em um segundo o quarto estava praticamente vazio, restando apenas o coronel, Muriçoca com sua espingarda, Bolonha ainda choramingando, e o enfermo, tentando descobrir onde estava. O coronel dirigindo-se a Muriçóca e dona Bolonha disse:
- Por um acaso vocês tão surdos? Me deixem suzinho com o homem que tenho muito à prosear com ele.
- Mas coroné... – protestou Muriçoca enquanto Bolonha resmungava: - Meu menina... meu menina...
- Fora! – ressaltou o coronel Vitelo. Quando se encontrou finalmente a sós com o moribundo disse:
- Pelo jeito, vosmecê tá melhor. Bom, pelo menos para ficar de saliência... Agora diga cabra, quem é tu? O homem, sem se intimidar pela arma na mão do coronel ainda esfumaçando devido o disparo, disse:
- Portovaldo Justomar.
Justomar a essa hora – disse o coronel aproximando-se ainda mais da cama – tá comendo grama pela raiz! A não ser que vosmecê seja ele vindo do outro mundo mais escurinho. Mas eu nunca ouvi falar de espírito que tenha febre por três dias! E já que tu não é nenhuma assombração, desembucha, quem é tu?
Depois de exitar um pouco, o homem finalmente começou a contar-lhe sua história:
De como sua mãe, enganada por um homem que prometeu casar-se com ela, saiu da casa onde morava, e como acabou sendo abandonada por ele em plena capital pernambucana, grávida e sem lugar para ficar. A dificuldade que ela passou para arrumar moradia por ser negra e ter um filho um pequeno, e como ela tornou-se mulher da vida para não morrer de fome. O dia em que viu o homem que a ludibriou chegar no bordel onde trabalhava, e a surra que levou dos capangas dele ao identifica-lo. Os meses em que definhou até a morte. O juramento que ele fez aos 12 anos em frente ao tumulo de sua mãe de vingar-se do homem que desgraçou suas vidas, mesmo este sendo seu pai. E finalmente, o cumprimento dessa promessa nove anos depois: A emboscada a Portovaldo Justomar e seus capangas.
O resto da estória Coronel Vitelo de Arroba Vastos já conhecia. O único sobrevivente do ataque conseguiu chegar ao centro de Curiapeba, mas acabou morrendo duas horas depois. Porém, antes de morrer, foi acudido na farmácia Hipócrates por João Tolentino Clepaúva. Lá, confidenciou ter sido tocaiado juntamente com coronel Portovaldo Justomar e o outro capanga, por um único homem de mãos vazias.
A história fora noticiada logo na manhã seguinte pelo periódico “Os Sertões” numa reportagem de Aristarco Viera Melo que explicava que “o coronel Portovaldo Justomar, após 5 anos sem dar as caras em Curiapeba, vinha a cidade para uma consulta com seus advogados Polissálabo Saraiva e Walcírio Torneleiros Waluá, com respeito a suas propriedades que haviam sido invadidas por posseiros, e acabou sendo morto em tocaia na Estrada Rumo do Sertão Alto, junto com dois de seus capangas, por um negro desarmado.”
A noticia acrescentava ainda que “embora não viesse muito a Curiapeba, ficando a maior parte do tempo lá em Salvador, Portavaldo não deixará saudades nem aqui, nem lá e nem em lugar nenhum.”
A noticia tanto era verdadeira, que na noite em que o coronel Vitelo de Arroba Vastos encontrou o assassino à sua porta, ele estava vindo justamente de uma comemoração morte de Justovaldo, seu velho inimigo. Embora poucos soubessem exatamente o motivo de seu ódio ao finado, era certo que agora coronel Vitelo sentia-se em debito com o vigador pela morte de seu algoz. Mas havia algo que o ainda intrigava o coronel, a que ele tratou logo de perguntar:
- E por que diacho vosmecê disse que se chamava Portovaldo Justomar?
- Do mesmo jeito que aquele disgramento tirou tudo de mainha, eu quero tirar tudo dele, inté seu nome.
O coronel ria-se por dentro, pela estupidez do homem que, após matar seu inimigo, resolveu assumir o nome dele. E ria-se ainda mais de justamente o fato de esse ter se identificado pelo nome do defunto, o intrigado tanto, que o fez impedir Muriçoca de mata-lo.
- Bom – prosseguiu coronel Vitelo – agora que tudo está esclarecido, resta um causo a ser resolvido. Eu não sei direito oque aconteceu entre vosmecê e a menina Rosalinda...
- Eu não entendi direito – apressou-se em justificar – eu acordei e ela tava me bejano.
- Safadinha, hein? - pensou alto o coronel. - bem, o certo é que eu cunheço a rapariga desde que veio ao mundo. E ao que me consta, ela ainda é donzela. É justo que vosmecê se retrate com a mãe da moça.
- Mas – respondeu – eu não tenho morada. Desde que mainha me deixou suzinho no mundo, eu ando por esse mundão de Deus, aqui e acolá sem rumo certo. E agora que cumpri minha promessa, vou ter de prócura um lugar pra vivê. Inté lá, eu não tenho como cuidá da moça!
- Pra isso dá-se um jeito. Vosmecê casa-se com a menina Rosalinda, e vem trabaiá mais eu aqui em minhas terras.
- Num sei o que lhe dizê coroné. – respondeu – Eu juro por tudo que há de mais sagrado, que de hoje em diante, hei de serví o sinhô.
- Num se avexe home. – interrompeu coronel Vitelo, encabulado pela bajulação – Venha, temos um casamento pra preparar. E quanto a seu nome...
- É Portovaldo Justomar agora – respondeu.
- Que assim seja - finalizou o coroneu.
As semanas que antecederam ao casamento passaram voando. Tanto Rosalinda quanto Portovaldo mostravam-se empolgados. E na fazenda, não havia que trabalhasse mais que Justomar, sempre auxiliando os outros em seus afazeres, adquirindo assim a simpatia de todos. Bem quase todos.
Muriçoca, enciumou-se com a atenção dada a Justomar, só porque ia casar-se com a “filha da gorduchona”.
Já Bolonha, que chegou a fazenda achando que o coronel a assumiria como mulher, depois de ganhar tanto peso e perder a beleza, passou a projetar sua fantasia na filha, imaginando que ela se casaria com Cevilho saraiva de Arroba Vastos, o filho do coronel. Ao ver a filha preste casar-se com um forasteiro, negro e sem posses, quase morreu de desgosto.
O casamento foi realizado no dia 27 do mês corrente, em frente ao casarão. O padre Giracino Bembém de Arruda Real, em consideração ao coronel (e a bela contribuição do coronel a sua igreja), veio abençoar os noivos. Depois do casamento, os dois foram morar num casebre cedido a eles pelo coronel, que ficava próximo a um Corguinho que cruza toda a propriedade indo desaguar no rio das voltas.



CONTINUA...

***AGRADEÇO A TODOS QUE ESTÃO ACOMPANHANDO AS AVENTURAS DE PORTOVALDO E POSTANDO SEUS COMENTÁRIOS.
ESPERO QUE LEIAM ESTE NOVO CAPITULO E CONTINUEM COMENTANDO.
OBRIGADO E ATÉ A PROXIMA.


terça-feira, 22 de abril de 2008

Uma Morte no Teatro

Me considero um homem de bom gosto,cultural e intelectual.Leio e componho poesia;visito exposições dos mais variados artistas e escolas de arte,por toda a cidade;devoro os clássicos da literatura;medito ao som de música clássica e erudita;e vou ao teatro asssistir espetáculos semanalmente.Adoro teatro.Quando não há um espetáculo sendo encenado em minha cidade,vou à alguma cidade vizinha.Até mesmo já me dispus à escrever algumas peças ,que,infelizmente,não tenho contatos pessoais para torná-la um espetáculo encenado em algum teatro.
Como o leitor pode supor,sou um intelectual solitário.Pra mim,é até bom,pois não gosto de aglomerações,muito menos de estar acompanhado de alguém que falaria durante a apresentação,tirando minha concentração.Deste modo,quando ocorreu o fato que contarei a seguir,eu me encontrava sozinho.
A peça era uma ópera.
Gosto de me sentar longe do palco,de modo a poder admirar todo o espetáculo em meu campo de visão,sem precisar mexer muito o pescoço.então,naquela noite,lá estava eu,na última fila.
A casa possuia uma lotação satisfatória,o que me agradou.Eu já disse que odeio aglomerações,mas,como amante das artes,fico feliz quando vejo muitas pessoas prestigiando um espetáculo.E o teatro em que estávamos,eu nunca tinha estado entes.Me causou uma boa impressão.
O prédio também era muito bom.Novo.Limpo,poltronas macias.O teto parecia firme e seguro(ainda bem,pois seria uma tragédia se "o céu caísse sobre nossas cabeças").
A peça começou.todos em silêncio.Minha atenção,como sempre,no espétáculo.Nem as pesoas ao meu lado pareciam -me realmente estarem lá.
À um certo momento,desviei levemente minha atenção para algo que ahcei ver com o canto do olho.Um movimento nas sombras,no teto.Olhei para ver o que era.Não vi nada.Achei que poderia ser um morcego.Ou talvez fosse apenas minha imaginação,ou mesmo uma ilusão de ótica.Ainda assim,passei meu olhar por todo o teto,pelas armações de sustetação do teto e suporte das luzes.Não encontrei nada(afinal,o que teria lá pra ser encontrado?),e voltei minha atenção para a peça.Fiquei um pouco frustrado por ter desviado minha atenção dela,mesmo que por poucos segundos.Felizmente,eu já conhecia a peça,pois já havia visto outras encenações dela.
Mas fiquei curioso em saber o que eu tinha visto."Quando a peça acabar,e as luzes se acenderem,vou olhar novamente para o teto,em busca do que quer que fiosse que tirou minha concentração e atiçou minha curiosidade",pensei.
Um certo tempo depois,novamente algo no teto atraiu minha atenção.Pareceu-me que algo havia refletido um pouco de luz.Como minha curiosidade já estava maior que nminha atenção pela peça,fiquei olhando para o teto.Novamente,vi uma luz refletida levemente em algo pequeno.Muito pequeno.E se movia.E pareceu-me que havia um vulto grande perto desse objeto.O vulto estava nas armações.Pelo tamanho,acho que devia ser uma pessoa.
E o objeto pequeno que refletia a luz se mexia.De repente,já não via mais a peça.Era como se eu não estivesse mais lá,só o som da peça chegava aos meus ouvidos,mas eu não dava atenção.O objeto se movia,apontando para todo o teatro,como se estivesse procurando algo.Ou alguém.
O objeto era triangular.Pude notar quando ele apontou em minha dirção.Meu coração palpitava,minha respiração ficou mais rápida.O objeto parou em minha direção.Podia sentir que o objeto triangular apontava para mim.senti meu suor escorrer por minhas costas.Fiquei paralisado;Não conhecia as pessoas que estavam ao meu lado.Do meu lado direito,uma moça que estava abraçada À um homem,provavelmente seu namorado.Do meu lado esquerdo,um senhor de idade avançada,óculos na ponta do nariz,e o queixo apoiado no punho.A atanção totalmente voltada à peça.Eu não conhecia ninguem.Não sabia o que fazer.Não podia causar um escândalo.Fiz a única coisa que podia.Desviei meu olhar,de volta para a peça.
Mas não conseguia me concentrar nela.Só pensava no brilho triangular,que notava pelo canto do olho.O brilho triangular que apontava pra mim.O brilho triangular que desviou de mim.
Um pouca aliviado,olhei para as armações,e vi o brilho se desviando para o outro lado do teatro.Ao redor do objeto triangular,havia um brilho mais leve,em semi-círculo.Esse outro brilho foi mudando de forma,ficando mais ovalado,formando uma elipse.Então,o objeto triangular foi atirado com velocidade na direção do público.Ouvi um gemido abafado.
A peça continuou por poucos segundos.Enquanto isso,segui o vulto com o olhar até a parte das armações que ficava acima do palco.Então,o vulto sumiu por algum lugar.
De repente,um grito de mulher meio que me despertou do meu transe.Todos no teatro olharam na direção dela.Os atores,no palco,pararam de encenar,olhando pra ela.A mulher estava de pé,gritando histerica.As luzes se acenderam.Um homem havia sido flechado e morto.Nas circunstâncias,não seria apropriado dizer,mas me senti aliviado.Aliviado por não ter sido eu.
Quando a polícia chegou,as pessoas que não eram próximas do morto foram liberadas.Eu fui embora,sem sequer dar depoimento do que vi.
Eu não gosto de jornais sensacionalistas e sanguinários,por isso,não sei quem era o homem assassinado,nem o motivo do crime.Não me interessa saber.
E eu nunca mais voltei àquele teatro.

domingo, 20 de abril de 2008

A HISTÓRIA DE PORTAVALDO JUSTOMAR E DO FILHO QUE ERA MAIS NÃO É E DO QUE NÃO ERA MAIS É.

(história baseada na obra de Aristides Theodoro sobre a fictícia cidade de Curiapeba)

CAPITULO PRIMEIRO:DA CHEGADO À FAZENDA BARAUNA PROXIMA AO RIO DAS VOLTAS


          Essa é mais uma daquelas histórias que tornaram-se lendas no sertão baiano.A unica coisa que nos faz acreditar que ela seja verdadeira, é o fato de ter acontecido em Curiapeba: a cidade onde o improvavel e o impossivel fazem parte do cotidiano.
          Tudo aconteceu muitos anos atrás quando um Coronel chamado Vitelo de Arroba Vastos, chegava em sua casa, juntamente com seu capataz Barbaré Muriçoca, após uma noitada regada à catiola e outros tipos de cachaça. O coronel e Muriçoca havia bebido tanto, que só conseguiram chegar em casa graças aos cavalos que já conheciam o caminho entre o bar no centro e a sua fazenda Baraúna, que ficava proxima ao Rio das Voltas .
          Os cavalos pararam em frente as porteiras e, enquanto o coronel parecia dormir montado na cela do cavalo apoiado em sua enorme pança, como um pombo velho em um poleiro, Murissoca aos tropeços, desceu da montaria e foi abrir as porteiras. Colocou a mão na tranca, mais se apoiando do que tentando abri-la, quando de repente viu um vulto surgir do mato alto ao lado. Na mesma hora, levou a mão na cintura afim de apanhar sua arma, mas encontrou o coldre vazio. Quando olhou para frente, arregolou os olhos vermelhos de embreaguês ao perceber que a figura sobria estava empunhando sua própria arma!
          - Não podi sê, como ele foi tão ligeiro?!! - pensou Murissoca, e auxiliado pelas primeiras luzes do sol que estava raiando, passou a avaliar a ameaça que seu oponente representava:
          Um negro alto e atlético, com um rosto severo e olhar esguio. Ele estava de pés descalços e sem camisa, coberto apenas por farrapos que um dia haviam sido uma calça; E o pouco que restava do velho tecido branco, estava salpicado de manchas de sangue seco.
          Coronel Vitelo, que até então parecia alheio a tudo em meio a sua bebedeira, sem nem mesmo abrir os olhos – que já eram fechados por natureza - murmurou através do protuberante bigodão:
          - Fale logo cabra!! Se é dinheiro que vosmecê quer, fique sabendo...
          - Não sinhô, num carece de se preocupá não. Eu num quero lhe fazê mal. Só apanhei o revolví por que num quero que ninguém se machuque. - sensurou o negro.
          - Se ocê num quer machucar ninguém, então me diz o que quer. - questionou o Coronel. -           - Eu venho lhe pedí guarida. Um bocado de pão e um gole d'agua pra modi eu tomá meu rumo. - respondeu. Coronel perguntou então: - por acaso vosmecê tem nome?
          - Meu nome é ... é ...o negro pausou, como que fazendo força para lembrar o próprio nome e finalmente disse gaguejando: - Por-portovaldo, Portovaldo Justomar... O coronel deu um salto na cela, como se tivesse visto uma assombração.
          - Portovaldo Justomar?! Num podi sê!!
          O negro abriu a bocarra como que querendo continuar a falar, mas mostrava-se sem forças até mesmo para manter os olhos abertos. Com a face coberta de suor e as mãos tremulas, começou a cabalear, de um lado para o outro, até enfim cair por terra feito árvore podre decepada pelo machado. Murissoca, que estava com as mão estendidas para o céu diante da revolver, como quem implora a Deus por sua vida, demorou uma eternidade para notar a arma caida à seus pés. Daí, jogou-se no chão fingindo agilidade, apanhou o trabuco e disse:
          - Só um instante Coroné, que eu estóro o bucho desse disinfeliz.
          - Vá pra baixa da égua seu peste – retrucou o Coroneu - Quem merece chumbo é tu. Cabra que é macho de verdade, deixa outro bulinar inté sua mulé, mas nunca deixa outro pegar em sua arma. Venha, coloque o homem em sua corcova de jegue e carregue o homem pra dentro.

CONTINUA...




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